Aquilo sentia que talvez não conseguisse sobreviver dessa vez porque já estava naquela relação simbiótica havia diversos anos. A troca era simples: Aquilo pedia, com muito garbo e elegância, que a conífera a alimentasse. A conífera, em troca, pedia que aquilo lhe ajudasse a crescer, e assim a troca sempre parecera justa. Nos primeiros anos a conífera transbordava sua vitalidade para aquilo, mas com o tempo, conforme a conífera ia envelhecendo, as trocas eram cada vez mais dispendiosas. Aquilo chegou a alcançar tamanhos e formatos considerados bem grandes para sua espécie, nos tempos áureos das trocas com a conífera, mas agora todas as permutas eram extremamente miúdas.
Aquilo ouvira, durante muito tempo, a conífera contar sobre as suas lembranças, de eras tão antigas quanto a alvenaria e até mesmo do fogo e da roda. Como o mundo era simples, sem variações. O discurso todo soava como desilusões de um velho decadente. A única contrariedade era que a conífera não era tão velha assim e sua saudade do passado era baseada em memórias não cultivadas por ela mesma, mas sim por causa de seus antepassados, através de lembranças herdadas no código genético.
Frequentemente a conífera lembrava àquilo sobre a inevitabilidade de seu fim, e que seu tempo estava chegando. Aquilo ria, falando que ainda faltava bastante, mas no fundo um arrepio subia por seu estipe, e fazia seu píleo encher-se de preocupação. Chorava, todas as noites, seu esporos, esperando que de algum deles pudesse surgir um transgressor genético que pudesse crescer junto de alguma angiosperma  podendo assim manter seus descendentes vivos, ecoando no corredor da vida na natureza.
Aquilo, como todas as coisas naturais desse planeta, teve o seu fim, num novembro frio. Um homem, de súbito, veio e arrancou-lhe de sua terra, de sua casa. Sentiu seus micélios desconectarem da conífera, e então, de hora para outra, os pensamentos que as duas compartilhavam, simplesmente cessaram. O silêncio na consciência que aquilo pode usufruir foi uma descoberta única e talvez das mais prazerosas. Só sua voz ecoava pelo seu corpo. Só sua existência naquele ambiente. A felicidade era tamanha que aquilo nem se importou de ser fervido, e depois batido com morangos e suco de laranja, pelo contrário, desceu pelas paredes da garganta de um desconhecido disposto a dar-lhe a melhor experiência que ele pudesse vir a ter em vida. Aquilo iria lhe retribuir o favor de ter descoberto a liberdade, e iria proporcionar o mesmo a quem lhe tomara.

D